O PRIMO DO BASÍLIO

Ele falava pra todo mundo lá na padaria do "seu Manoel" no bairro do Mandaqui, que era primo do herói corinthiano Basílio, autor do famoso gol que deu o título do Campeonato Paulista de 1977 ao Timão e libertou a Fiel de um sofrimento de 23 anos sem títulos. Com essa história José Roberto Basílio, o Zoca como é conhecido, se tornou figura emblemática no bairro.
Ele participava das peladas nos campos e quadras das redondezas desde garoto, mas nunca demonstrou ter qualquer inclinação para o futebol. Os amigos o deixavam participar na esperança de algum dia serem premiados com a visita do primo ilustre e, quem sabe, ganharem um autógrafo seu. Porém, jamais alguém tinha visto o Zoca na companhia de seu primo famoso, o João Roberto Basílio, ou apenas Basílio no meio futebolístico. Ele também nunca mostrou pelo menos uma foto ao lado do jogador, nem tampouco um autógrafo e nem mesmo uma camisa 8 do Timão dos anos 70, o que poderia até serem aceitos como prova de seu parentesco. Mas nada. Apenas a semelhança do nome e o mesmo sobrenome é que davam sustentação ao figurão Zoca. O "seu" Manoel, dono da padaria onde o pessoal se encontra todo sábado depois das peladas pra tomar umas geladas e jogar conversa fora, ficava indignado.
Certo dia ele pôs uma pressão em cima do Zoca:
-Ó gajo, tu falas aos quatro cantos que és primo do tal Basílio, o herói corinthiano, mas até hoje nunca ninguém te viu com el', ó pá! Que raio de parentesco é iesse, homem? Pelo que sabemos o tal Basílio não é esnobe nem nada, é um gajo bestial. O que passa?
-Ah "seu" Manoel, sabe como é né. Gente famosa não gosta de ficar por aí dando mole. Tem que preservar a imagem. Meu primo é muito reservado. Mas eu vou sempre à casa dele, quando faz churrasco me convida.
-Está certo, se tu dizes eu acredito, mas tu vais fazer uma coisa por mim.
-Diga lá portuga, o que é? - disse o Zoca.
-O Basílio começou a carreira na minha querida Lusa, ó pá. Então, quando fores à casa del' eu vou mandar uma camisa da briosa para el' autografar pra mim.
Por essa o Zoca não esperava. Gaguejou e falou:
-"Seu" Manoel, vai ser um prazer fazer isso para o senhor, mas vai ser assim, de graça?
-Eu sabia que tu não me farias um favor desses a troco de nada não é. Pois bem, que todos sejam testemunhas que no dia que trouxeres a minha camisa da Portuguesa autografada pelo teu suposto primo Basílio, terás direito, tu e teus amigos a beberem cerveja de graça, todo sábado por um mês neste estabelecimento.
Os olhos de Zoca brilharam e a euforia dos amigos foi grande. Porém o "seu" Manoel, que não é burro nem nada completou:
-Mas tem uma condição aí, não penses que vai ser assim tão fácil, ó pá.
-Pode falar "seu" Manoel, qualquer coisa eu aceito.
-Você e seus amigos poderão beber cerveja de graça todo sábado, durante um mês neste estabelecimento, desde que teu suposto primo Basílio esteja junto, confere?
Enquanto "seu" Manoel dava gargalhadas alisando o bigode os amigos do Zoca ficaram calados olhando um para a cara do outro na certeza de que não teriam cerveja de graça coisa nenhuma.
Porém o Zoca respondeu:
-"Seu" Manoel, me dá cá a camisa da Lusa e pode encher suas geladeiras que no próximo sábado já vai ter cervejada aqui.
-É o que vamos ver, é o que vamos ver "seu" Zoca.
E Zoca pegou a camisa das mãos do português e se foi.
Passada uma semana, no sábado seguinte, no fim da tarde como de costume, a turma que havia jogado uma pelada se reuniu na padaria do "seu" Manoel, porém o Zoca não estava presente.
O semblante do português ficou sério e com ares de preocupado perguntou aos presentes:
-Onde está aquel' tratante? Cadê o Zoca com a minha camisa da Lusa? Será que perdi o freguês e a minha adorada camisa da briosa? Era só o que me faltava, como fui acreditar naquel' mentiroso?
De repente, para a surpresa de todos entra na padaria o Zoca com a camisa da Portuguesa devidamente autografada por Basílio e com uma inscrição: "cerveja tem que ser bem gelada".
O portuga quase caiu das pernas. Zoca então falou:
-Portuga, desce cerva bem gelada para mim, para meus amigos e para meu primo Basílio.
E eis que para a admiração de todos e desespero do "seu" Manoel entra no estabelecimento o grande ídolo da nação corinthiana Basílio, autor do gol mais famoso do Brasil e fala:
-Nunca duvidem do que  um Basílio é capaz.
E durante os quatro sábados seguintes a rotina na padaria do "seu" Manoel foi a mesma. Cerveja de graça para os amigos do Zoca e para o primo Basílio.
Até hoje não se sabe se o Basílio é mesmo primo do Zoca, mas que ele gosta de uma cervejinha, isso é sabido por todos.