O CORINTHIANO - TAL PAI, TAL FILHO


Ele não sabia dizer desde quando era corinthiano. Quando se conheceu já era. Mas sabia exatamente o por que da coisa. Seu pai. O pai nunca o levara ao estádio, nunca lhe comprara uma camisa do time, nunca lhe ensinara a cantar o hino, nunca lhe dissera uma escalação, nada. Talvez porque ele mesmo nunca fora ao estádio, nem tivera uma camisa, não sabia cantar o hino e talvez nunca soubera a escalação do time algum dia. Mas o pai era corinthiano de coração e isso ele soubera desde que começara a entender as coisas do futebol.
Ele era apenas um garoto nos anos 70 e as coisas não eram nada boas para o Corinthians naqueles dias. Havia muito não ganhava nenhum título importante e seu pai sofria como qualquer corinthiano naquela época. E foi assim, por solidariedade a seu pai que se tornou corinthiano também. Os garotos da escola, do bairro e até seu irmão que era santista zombavam dele porque seu time não ganhava títulos. Não era fácil a vida de um corinthiano naquele tempo. O único título de que se lembrara era de um tal torneio Laudo Natel que não tinha valor algum ante os títulos dos campeonatos paulista, brasileiro, libertadores da américa e mundial que os concorrentes vinham ganhando. Mas ele não se importava, se seu pai sofria e suportava, ele também podia fazê-lo, afinal, ele sentia que algum dia seu time seria campeão. E foi em 77 que o tão esperado título chegou, após 23 anos de espera. Seu pai ficou feliz, claro, e ele também. Comemoração juntos, nem pensar. O pai era um tipo reservado, de poucas palavras, sisudo quando estava em casa e não demonstrava nenhuma espécie de sentimento afetivo. Fora de casa contava piadas e fazia os outros rirem, adorava uma festa. Ele nunca entendeu o comportamento do pai e não tinha oportunidade de perguntar nada porque não havia diálogo, não era possível dizer-lhe que o amava e jamais ouvira de seus lábios que lhe amava, mas ele sabia que de alguma maneira havia amor de um pelo outro. Ele ficava feliz quando via o pai feliz e ficava triste quando este estava triste. 
Os anos se passaram e muitos outros títulos comemoraram, mas nunca juntos. O máximo que conversavam quando ele ligava para falar com a mãe e seu pai atendia era – e aí pai, campeão de novo hein – e o pai respondia – pois é – e chamava sua mãe ao telefone. O pai falecera no ano 2000, justamente quando o Corinthians ganhou o título máximo, o mundial da Fifa. Depois disso foram muitas alegrias até o ano 2007, quando o glorioso Timão fora rebaixado para a segunda divisão do campeonato brasileiro. 
Ainda bem que meu pai não viu senão ele iria sofrer e eu sofreria em dobro, por mim e em solidariedade a ele - pensou consigo. 
Mas sentiu falta por não  poder comentar com o pai aquele fracasso, mesmo sabendo que ouviria apenas um “pois é”. 
Ele nunca dissera ao pai que era corinthiano por sua causa, mesmo assim era agradecido à ele porque com ele aprendera a amar o Corinthians e a paixão de um corinthiano é uma coisa inexplicável. A frase “nunca vou te abandonar” criada pelo departamento de marketing após o rebaixamento à segunda divisão já vivia nele desde sempre, que começara a amar esse time na pior época de sua história.  Talvez em sua cabeça de menino e mesmo agora de homem ele acreditasse que ao demonstrar seu amor pelo time do coração de seu pai, este, de alguma maneira, entendia que essa era a sua forma de dizer que o amava também.  
Por isso, para ele, ser corintiano é uma questão que vai muito além do futebol, tem a ver com o desejo de ter algo em comum com uma pessoa que lhe era muito importante mas que de alguma forma, sem explicação, lhe era inacessível: seu pai. Pois é!